DEPENDÊNCIAS: A TERRA DE NINGUÉM I

A relação entre drogas e nós, humanos, é longa e interessante.



Quem não se lembra de Noé, que, após 40 dias socado num barquinho com tudo que era tipo de bichos, a primeira coisa que fez ao pisar em terra firme foi tomar um sonoro e merecido porre?

Os gregos tinham seus bacanais, os índios das Américas suas festas, e qualquer grupo humano sempre usou, de alguma maneira, alguma coisa para alterar a percepção da realidade ou para recriá-la.

Até a invasão da América do Sul pelos espanhóis, o uso de drogas costumava ser parte de rituais festivos e/ou religiosos, sem qualquer efeito colateral na vida do dia a dia de seus usuários.

No início, os invasores não deram muita bola para essa mania dos índios de mascarem as folhas da coca, mas, tão logo perceberam os efeitos, a primeira coisa que fizeram foi taxar fortemente o produto.

Foi somente em 1855, que o alemão Friedrich Gaedcke isolou o alcaloide das folhas, e a partir daí, todo mundo começou a usar nas mais variadas formas, como droga milagrosa, e, só no começo do séc. XX, começou-se a estudar seus efeitos aditivos.


Já com o ópio, no início do séc. XIX, mercadores britânicos começaram a contrabandeá-lo para a China, como forma de contrabalançar seus gastos com a compra do chá para vender na Inglaterra.

Em 1939, a China colocou restrições seríssimas à importação de ópio, confiscando o mesmo dos mercadores ingleses. Pronto, foi o que bastou para a Inglaterra atacar a China, que perdeu a guerra, e foi forçada a assinar o Tratado de Nanjing (1842) que, além de ceder Hong Kong aos britânicos, abriu inúmeros portos ao comércio do ópio pelos já citados súditos de sua majestade.


Bom, há centenas de exemplos a serem usados, mas esses dois bastam para apontar que, com drogas, o que vem obviamente funcionando desde cerca de 1600, é seu comércio e o incrível lucro com elas obtido.

O último relato que tenho da ONU, de 2003, estima esse mercado em cerca de US$ 400 bilhões anuais, lá juntinho com o mercado das armas e do petróleo.

E, da mesma maneira que esse tipo de mercado prolifera e se reinventa, reinventam-se e proliferam centenas de “tratamentos” sob as mais diversas égides. Ficamos tão especializados, que já não se trata o paciente, mas sim o “crack”, a “cocaína”, o “álcool”. E muito curiosa fico a respeito de saber como é que se trata uma substância.

Mas, para falarmos de drogas e drogados, é preciso antes de tudo, uma definição.

Assim droga, pelo dicionário médico, é qualquer substância que, ao entrar num organismo, por qualquer via, neste provoca alterações químicas. Por essa mesma definição, há apenas 4 coisas que não são consideradas drogas, a saber e por ordem alfabética: água, ar, comida e sexo, pelo simples fato que são as bases de nossa sobrevivência como indivíduos e como espécie.

E é exatamente aqui que nós humanos conseguimos usar os acima citados como se drogas fossem.

Para os felizes de nós que vivemos em São Paulo, conseguimos até enxergar a droga do ar que respiramos. Logo, logo, ninguém mais precisará de antibióticos ou antidepressivos, bastando beber água da torneira para se drogar.

Comida, nem comento, com as consequências do diabetes tipo II, colesterol elevado, e outras cositas mais.

E chegamos ao sexo que, desenhado para ser uma das experiências mais prazerosas da interação humana, acaba sendo usado e abusado por poder, para esquecimento ou falta do que fazer.

Esquecemos que “drogas” não nos atacam. Nós as procuramos, pagamos e ingerimos, e a prova cabal está no fato de que nunca, jamais, em tempo algum, uma garrafa de bom prosecco geladinha correu atrás de mim berrando: “me bebe, me bebe”.

Assim é que dependências são fenômenos de pensamento e comportamento, com pensamento obsessivo e comportamento compulsivo.

Pensamento obsessivo é quando não se para de pensar numa coisa (Qualquer coisa: namorado/a, droga de preferência, o porquê o colega de trabalho não sorriu pra mim hoje, não faz diferença).

Comportamento compulsivo é quando uma pessoa se comporta de determinada maneira, não porque quer, mas por que precisa (ou acha que precisa, o que não faz a menor diferença).

Concluindo, a drogadependência é um distúrbio obsessivo-compulsivo, e não faz absolutamente a menor diferença qual droga a pessoa use, sendo, portanto, totalmente inoperante o tratamento da substância.

No próximo post (prometo que ainda essa semana), veremos os tipos mais conhecidos de tratamentos, seus prós, contras, sucessos e falhas.

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